Ele está aqui. Escondido na bruma.
E eu, sem saber como, sem saber nem ao menos a razão, sem saber que ele poderia estar ali, ali estou - à sua procura.
Não sei se ele procura por mim, não sei o que ele procura - se é que ele procura alguma coisa- enquanto penetra mais e mais dentro da neblina.
Mas ele está ali. Posso sentir seu cheiro de predador, ouvir a sua respiração. Eu, presa e ao mesmo tempo caçadora, estou apenas sentindo.
Ansiando.
...
E, no meio da bruma, surge uma sombra. A sombra dele.
Eu, petrificada. Ardendo por dentro.
Ele se aproxima devagar. Os olhos de uma fera, que a tudo devora, que a tudo domina.
Eu tremo, de medo. E de desejo.
E ficamos, cada um do seu lado, em meio a bruma, nosso campo de peleja. Cada um analisando o outro. Vendo as forças, as fraquezas. Vendo o que estava além do olhar.
...
De repente, a fera salta. Me enlaça.
Não consigo resistir. Caio, me agarro à sua segurança felina. E ao, mesmo tempo, meu lado animal se revela.
Rasga, morde, fere, sangra. Luta.
A bruma nos oculta visualmente, mas não pode apagar os gemidos. Os gritos.
Os vestígios da luta de dois animais.
Onde está a presa e o predador? O algoz e a vítima?
Onde está eu e ele?
...
Mas, num súbito, tão súbito como o avanço, a fera se ergue.
Seu olhar já atinge além da bruma. Fareja outra caça.
Eu ainda estou no chão, vencida. Mas também vencedora.
E o espécime, vencedor e vencido, já não está mais ali.
Ele fareja, busca, decifra os sinais.
De repente, um carinho. E a fera corre. Corre para longe de mim, foge em meio à bruma, desaparece para um quiçá nunca mais.
...
Na bruma, sobra um grito calado. Um desejo calado nas sombras.
Me recomponho. Também é a minha hora de seguir.
Sinto chegar a luz do Dia. O Sol me fere.
Sou uma criatura da noite, caçadora e passional.
Não olho para trás.
Mas, algo lá dentro da bruma me diz que um dia a busca se repetirá...
...
Não esperarei; vou seguir.
Se a fera me achar, estarei pronta.
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