quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Entre o olhar e o gesto... (um conto)


 "Mal saem da casa, Lucas pára e abraça Paloma fortemente. Ela corresponde com simplicidade. Seus olhos estão fixos no luar, perdidos, como que encantados por uma dor silenciosa, escondida.
Ao se apartar dela, eles se olham nos olhos. Ela vê a luz, o brilho feliz nos olhos dele; sabe o quanto estar com ela o faz simplesmente mais feliz. Mas os olhos dela, ao contrário de outrora, são sérios, estão vagos e imprecisos em seu silêncio.
O que acontece com Paloma? Onde se encontra a menina doce, carinhosa e saltitante que, por tanto tempo, vivera ao seu lado? Agora, essa mulher que o encara é uma casca daquela mocinha apaixonada de outrora, com seus olhos calados e uma seriedade incomum.
- Ei, você tá bem?
Ela sente vontade de chorar. Segura o desejo, pois não quer abrir seu coração. Por mais que Lucas seja o seu companheiro, o seu maior ouvinte, não é uma história que quer compartilhar com ele. Respira fundo, antes de responder.
- Nada, Lucas. Eu mudei. Foram oito meses separados, claro que haveria mudanças da minha parte...
- Mas você não é assim...
- Eu tou bem, é sério.
Ele anui, silencioso. Retornam a andar; ele segura a sua mão, como sempre o fazia quando andavam juntos.

Falavam da vida, do trabalho dele, da visita de uma amiga dela; mas ela falava apenas para calar seus pensamentos. Seus olhos ainda procuravam a Lua Cheia, desesperada; seus pensamentos caíam na curiosidade de saber se, há milhas e milhas dali, Miguel chagara a ver aquele luar embriagante.
Lucas continuava sentindo o seu silêncio, a sua dor calada; mas Paloma se negava a admitir seus sentimentos. O que ela iria falar? Abrir a sua boca para dizer que, naquele momento, naquela noite, sentia uma saudade tremenda de outro homem, que queria estar do lado dele, aqui e agora? Por melhor que fosse (e ela sabia que ele o era), sabia muito bem que aquele homem sofreria com a constatação da sombra desse outro a interpôr-se entre os dois - ainda que esse outro (e como Paloma o sabia, meu Deus!) já tivesse se retirado da sua vida, já vivia em seu outro universo, com outras pessoas, necessidades, mulheres talvez!
Ela já custava para controlar seu pranto. Abaixou a cabeça, quando se sentiu perto, perigosamente perto, de chorar; mas, não sabia como, conseguiu se controlar no momento exato em que o soluço estava alcançando seus lábios. Teve sorte, pois sabia que, quando cedesse à tentação de chorar, não pararia mais.
Enquanto andavam, Lucas sentia-se cada vez mais encantado pela jovem. Todo aquele amor que se ocultara durante os oito meses de separação agora surgiam-lhe com uma força que assustava. Estava feliz; não importava o que ela fizera enquanto não estiveram juntos, o mais importante é que ela estava aqui, ao seu lado, sendo sua mais uma vez.
Dominado por estes sentimentos, puxou-a e beijou-lhe a bochecha. Mas esse gesto não lhe foi suficiente: por isso, a puxou de encontro ao seu corpo e lhe beijou com urgência, desejo e amor guardados.
No começo, Paloma apenas deixou-se beijar, confusa. Entretanto... Naquele beijo havia tudo o que não tivera com Miguel, a despeito de toda a sua saudade - aquele era o beijo intenso que tanto amava, o abraço que tanto a fazia sentir-se mulher...
E ali correspondeu. Seu corpo se encontrou com o dele, sem sombras ou dúvidas. Naquele momento, tudo o que não fosse Lucas lhe sumiu da mente - era ele quem a amava, era ele quem estava propenso a compartilhar a sua vida com ela. E por mais que isso lhe machucasse, Miguel não seria capaz de tal ação. Era um fato importante, que fazia com que, apesar de toda a tristeza que poderia ser vista no fundo do seu olhar, no fundo do seu coração, aquele amor esquecido e esfriado voltasse a se aquecer, fazendo-a um pouquinho mais feliz.
Às vezes, um gesto fala mais do que mil palavras."

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