terça-feira, 30 de abril de 2013

CONTO: O sexo enquanto ciência, o amor enquanto dúvida.



A mulher, há vários meses, está com ele. A título eterno de "amiga", claro. Título este em que o autor não se dispõe a mudar, ora por motivos intrínsecos a ele, ora por ela e suas instabilidades. E a hesitação fica no ar, como névoa que encobre os caminhos e deixa um mortal na extrema solidão de um questionamento sem a menor chance de resposta.
Ela, há muito, se encontra em dúbios pensares a respeito. Ora aceita, pondo como prioridade a liberdade que poderia ter por novos amantes. Ora repudia, por sentir, no fundo do peito, uma afeição imensa na qual a amizade não comporta por si só. Ora apenas mantém no equilíbrio, deixando passar os dias nessa inquietante espera.
Não há novos amantes. Temporariamente. Não se sabe por ser ela tão fechada ao mundo, por amor ao homem, ou por conta de todas as preocupações que lhe inspiram o mundo real - tirando-lhe as possíveis oportunidades em que ela possa encontrar um outro alguém que seja ousado a lhe roubar as atenções. Há muito dos dois, e da personalidade tão restrita, tão isolada da moça.
O importante a dizer, é que ela não tinha em seu convívio, outro ser a lhe roubar a indecisão de seu coração, a tirar do pensamento aquele homem, tão esquivo porém tão seu.
Enfim, muitos meses se descortinaram atrás do casal. E, no hoje, estão juntos, de alguma forma.
E, qual o motivo?
Os dela, já foram descritos. E os dele? A mulher os coleta, nos momentos em que ele estão juntos, seja nas brigas (sim, ela já tentara, por vários momentos, romper esse laço que a angustia em muitos momentos, mas quem disse que ela o consegue?) ou nos momentos em que os corpos se encontram, traindo de ambos o título de "amizade" ao qual tanto estabelecem para as suas relações. Uma "amizade colorida", aonde há muitas histórias.
Sim, porque esta história não começou do acaso, de pouco tempo. Mas este não é o tema ao qual será atado na questão. Sigamos adiante.
A mulher tem, naqueles momentos, algumas respostas. O amor, que ele diz possuir ainda pela moça; o fato dele não lhe resistir os avanços - o cheiro, o corpo... Havia nela algo que o prendia, que o fazia não incluir uma nova mulher em seu cotidiano. Talvez por ele ser, um tanto mais que ela, fechado à novas situações, à novos romances - não se sabe exatamente. Tudo o que ela tem são as palavras dele - e já lhe são tão poucas...
Há algo que, ali, naquele ser tão próximo e ao mesmo tempo tão distante dela, a moça tem uma certeza: o corpo o atraía, o sexo o prendia a ela.
E ela jogava com este trunfo, não esquecido na manga - mas presente em cada gesto lascivo que ela colocava por sobre a cama, por debaixo do chuveiro, por cima de um sofá, sob um colchão na sala... Ela jogava, sim; mas com um critério de estudo, transformando aquele homem em um objeto sexual - onde o analisava cientificamente, biologicamente, em todas as formas possíveis.
Ela não tinha o corpo de uma deusa, de uma ninfa, do qual os demais homens do mundo desejem ao vê-la passar.
Nem ele possuía corpo melhor que o dela.
Eram comuns. Eis a definição perfeita: sem nada que os destacasse na multidão, na loteria do amor. Talvez isso os unisse tanto.
Enfim, ela se aproveitava da frágil resistência do "amigo" em relação ao seu corpo para, dessa forma, estudá-lo. Estudar o sexo como um todo, na prática.
E, dessa forma, gerando em si uma experiência tal, que em outros amantes não se fizera valer. Apenas aprendia, guardando em si as coisas de que gostava em relação ao prazer de um homem; porque, a ela, não lhe cabia a vontade de ter o prazer físico, a satisfação sexual que o mundo chamaria de "orgasmo".
Para isto, recorria à si mesma. Aos artifícios que levava à lume nas intimidades do seu lar, entre o anoitecer e o amanhecer.
Não era, dessa forma, o desconhecimento do prazer feminil que a fazia se concentrar unicamente nele. O que a mantinha, no ato sexual entre o casal, era o que ela sentia dentro da mente, o tanto que o corpo correspondia às carícias de um homem. Toda ela modificava-se: de uma reclusa, virava prostituta. Embebida na necessidade de conhecer os pontos fracos daquele homem.
E sabia que o conseguia. Sempre que estavam sob o efeito do sexo, ela mantinha para si a satisfação que ele demostrava.
E cada encontro, percebia essa satisfação crescer.
"Onde você aprendeu isso?", "Por quê essa definição de 'experiência'?" - ela o ouvia indagar entre gemidos, a cada nova forma que lhe ocorria na mente de lhe dar prazer, procurando também uma forma confortável de fazê-lo (não lhe era nada interessante sentir-se cansada enquanto agia nele). E os gemidos cresciam, as palavras tornavam-se ainda mais loucas, enquanto ela ia, com as mãos e língua, agindo sobre determinada parte do seu corpo, silenciosa e ousada, formulando hipóteses, criando teorias, imaginando se este ou aquele ato poderia dar certo com outra possível "cobaia".
Claro que ela, se esforçando bem, encontraria com alguma tranquilidade. Os homens, de um modo majoritário, não se detinham muito em considerações quando o assunto caía no sexo. Ela bem o sabia. Lia bastante. Ouvia por trás das portas, nas conversas um tanto machistas, naquilo que ela ia juntando e analisando, com um curioso rigor científico.
E, sentia-se exultante quando sentia, em seu corpo, as contrações dele, que lhe indicavam a chegada do gozo, quente líquido que lhe tocava a pele. Era quando o gemido ficava mais longo e alto, era quando ele esquecia-se de si e pagava-lhe em ternura a felicidade da satisfação ali dada, era quando o cansaço lhe amolecia o corpo.
E ela, ali, num sorriso contido, apenas registrava.
Deixava-o quieto por alguns instantes. Em seguida, voltava a mergulhar no contato do corpo dele, com a mesma intensidade do começo, enquanto ele, surpreso com a facilidade com que ela conseguia provocar o seu sexo, deixava que o seu vulcão interior o dominasse completamente - esquecendo ali todas as palavras ditas, entregue ao ato sexual, às experiências daquela prostituta/cientista que ali se encontrava, nua, sobre ele.
E acontecia de novo, de novo... E mais uma vez.
Numa mesma noite.

5 comentários:

Vinícius Cardoso disse...

Fiquei excitado! E me veio a mente toda a cena e o imaginário dessa cientista. De certa forma nós, ou alguns, somos todos cientistas; buscando satisfazer o prazer de seus pares, buscando qual toque faz mais 'estrago' etc. Nos faz refletir qual a verdadeira função do sexo: seria mesmo amor ou uma ciência? Thais me deixou na dúvida. Prefiro pensar não pensar e trepar.

Rogério disse...

é no minimo inquietante ser sentido como objeto de estudo e muito exitado pelo grau de sensualidade.

Kaliza disse...

Creio que somos cobaias de nós mesmos, quando nos permitimos experimentar nos outros e em nós. O texto me inquietou pela divergência da posição emocional em relação à posição sexual, basicamente. Se, quanto "relacionamento de coração", nçao dá certo, fica apenas o prazer do corpo a ser explorado, e, sim, já experimentei isso e é bom, apesar de ruim. A embriaguez do sexo nos detona, mas as horas de coração vazio detonam muito mais... E ficamos ali, buracos em nos que não podem ser preenchidos, a clamar por um "algo mais" que, por enquanto que não chega, vai sendo amenizado com mais e mais experimentos...

Priscilanee disse...

Só me fez pensar o quanto o sexo releva qualquer situaçao de raiva, odio, rancor. O desejo que parece ser maior q qlq outro sentimento. Entao, depois do ato parece que tu esta bem, mesmo q nao esteja. O sexo tem esse poder(?). Nos prende a uma realidade paralela. Nos nos faz relevar muita coisa pelo prazer, pelo toque, pelo gozo. Amei o texto, e como ja disse Kakah, somos cientistas de nos mesmos.

Thaís Soledade disse...

Engraçado, aqui, como a visão masculina e a feminina se desenvolvem... Aparentemente distintos, mas unânimes no tangente ao poder do sexo... Não sei se acredito que o sexo "releva" situações, já que - quando estamos na vertical - a situação negativa se mantém. E por isso vemos pessoas incapazes de amar serem ótimos amantes na cama (homens, em geral).
O que escrevi, muitas vezes, na parte sexual da coisa, encontramos nos homens... O emocional é nosso, feminino in extremis, mas profundamente real, tão real como o gozo e a satisfação física da horizontal (quer dizer, nem sempre horizontal, mas deixa pra lá...)

Mas uma coisa é certa: sim, todos somos cientistas. De um jeito ou de outro. E todos nós também somos objetos de estudo.

Será que você também aguenta esse aqui?

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