segunda-feira, 28 de novembro de 2011

(CONTO) A troca de olhares.


Ela o olhava do seu canto.
Ele a observava em seu trabalhar.
E, nas vezes em que essas olhadas coincidiam, os olhos de ambos se envolvendo, se entrelaçando, mesmo que por poucos segundos... Antes dela retirar-se, encabulada, da mútua contemplação à qual de dedicavam.
Nada diziam que chegasse a ser impróprio. Nunca agiam para além dos olhos.
Ela não sabia o que poderia significar esse olhar dele, mas adorava senti-lo em seu cotidiano morno e sem distrações, era adorável saber que era um alvo dos seus olhos - ainda que talvez a verdade deles não se alinhasse com o que ela acreditava ser. E também olhava, o fazia alvo em seus olhares ansiosos. Não raro era surpreendida, não raro ocorria o vice-versa.
Momentos fugazes de fascínio, ou de mera curiosidade?
Fora daquele lugar, onde o mundo se interpunha e os tragava para além de si mesmos, nada mais eram do que apenas conhecidos. Quem sabe estranhos.
Ele, num dado momento, lhe pediu seu telefone. Mas nunca ligou; e ela, por sua vez, não esperou. Se contentara com aqueles instantes visuais.
E desses instantes, derramava ilusões. Às vezes, com alguma quimera, uma candura romântica; noutras, com as mais nítidas cores de um encontro puramente carnal. Eram vários os pensamentos, que se reviravam em sua cabeça ao toque do olhar dele sobre ela, no instante em que seus olhos caíam nos dele, igualmente atentos - pelo menos na parte que a cabia.
Nada sabia dele, não queria nem mesmo que ele soubesse dela. Tinha medo.
Numa noite chuvosa, repentinamente, ele lhe oferecera uma carona.
Ela aceitou.
Ali estavam todos os ingredientes de um primeiro ato de um possível romance: noite de chuva forte, um carro, música suave...
Mas, apenas falaram sobre coisas triviais.
Riram.
Cantarolaram juntos.
Foi naquele momento que os dois perceberam que não lhes importava nada; nem acalmar os idealismos do coração, nem aplacar os anseios do corpo. Não precisavam de mais nada, a não ser o flerte, o misterioso encontro sem justificativas, a delícia do contemplar sem cobranças ou receios. Para que estragar tudo? Gastar a magia com meses de romance? Noites de prazer?
Não era isso que queriam.
No dia seguinte, tudo voltara a ser como era antes. Com um sorriso cálido de felicidade em ambas as faces.
Por menores que sejam, as pequenas coisas devem ser sempre preservadas.

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