sexta-feira, 14 de junho de 2024

Valores, laços, caminhos e evolução - Ou, simplesmente, a mudança do cata-vento da vida.

 Há alguns anos, em um jogo de tarô feito em plena praça 15 do Rio de Janeiro, me vi diante de um dilema apresentado em arquétipos: a chave para o mundo ou a raiz? Era uma época em que estava acreditando que uma nova vida se descortinaria diante de mim, e muitas oportunidades apareciam - só que, na realidade mesmo, estava estagnada e sem um rumo preciso. As coisas apareciam diante de apenas uma ótica aos meus olhos, restritos e limitados.
Eu era bastante limitada.
Se alguma alma caridosa cair aqui e, por ventura, olhar pra trás e ver meus escritos do passado, verá que eu era alguém oscilante e, ao mesmo tempo, focada na superficialidade emocional: a ideia de que alguém seria o suporte para que eu me encontrasse e conseguisse novos rumos para minha vida. Tinha o sonho de "ganhar o mundo", mas só tinha bases frágeis - ainda que eu estivesse, naquele momento, na primeira etapa de uma caminhada longa. Procurava inconscientemente por soluções mágicas, românticas, pueris e simples, não tinha a menor noção de que a vida era construída por partes. 

Um exemplo era a minha escolha de profissão: sempre quis ser professora, sempre amei a escrita, a arte, a música e a poesia. São coisas que carrego comigo desde sempre, mecanismos aferroados à minha pessoa. No entanto, na ocasião das cartas, nunca considerei que o futuro não era imediato ou que dependia que eu mantivesse os olhos atentos e a força sempre em alerta. Estava andando, mas de maneira vagarosa. Via os exemplos, mas não me dispunha a lutar, a correr atrás. Hoje, percebo que cada parcela da minha progressão profissional foi fruto de uma construção não isolada. Tive apoio, ajuda, tiveram confiança naquilo que eu queria ser e estava disposta a enfrentar, a formar. 
E, assim, cá estamos.
Cientes de que a estrada não acabou, mas que devemos fazer o melhor possível para formar uma história, que só se encerra no último suspiro.

Este jogo de tarô foi me apresentado em 2015. Nove anos depois, eu acho que estou entendendo. ACHO. Talvez, as certezas da minha vida sejam remodeladas; ou cristalizadas. Sei que isso depende unicamente de mim, ser a senhora do meu próprio destino.

No mergulho ao passado, das longas reflexões, lamentos e sonhos de minha mocidade aqui expostos, encontro uma expressão que me era muito comum. Ao lado das "crises byronianas" (meus espasmos depressivos com doses cavalares de drama juvenil), havia uma outra: "mudar o cata-vento da minha vida". Cada coisa que me acontecia, a minha ansiedade - ainda viva, ainda pulsante, mas um pouquinho mais controlada ou sublimada pela realidade - se perguntava: Essa é a hora que os ventos vão fazê-lo girar? Será com isso que chegará a tão sonhada felicidade? Será que, assim, eu encontrarei a mulher que tanto quis ser e que se encontrava presa perante todas as convenções familiares, sociais e mentais? A "Duanna" (pseudônimo poético durante tantos anos, simbologia de uma mulher vivida e forte, capaz de ver a vida com intensidade e leveza simultaneamente) aparecerá aqui? Eu lançava as perguntas e esquecia o principal: VIVER E ENFRENTAR.
Eu não vivia - seguia. Eu não enfrentava - deixava que as coisas andassem, muito por falta de confiança em mim mesma. Admito que as histórias de ontem me moldaram e me trouxeram lembranças inesquecíveis; mas nunca refleti porque aconteciam. Tive muitos sonhos realizados, mas não eram propriamente frutos do meu esforço, não eram conquistas minhas. 

Os anos, desde 2011, me ensinaram muita coisa.
Começou quando o maior alicerce da minha vida, a pessoa a quem mais me agarrava e também "culpava" por minha covardia de viver - minha mãe - caiu em uma depressão profunda, que a tirou dos eixos por anos e a fez parar no caminho. Ali, eu tive a consciência de que estava estagnada em um curso que, apesar de gostar, não me satisfazia, não me dava liga (ainda fui insistente um pouco, mais recentemente; mas os caminhos me provaram, mais uma vez, que não era pra ser). Ali, o desejo que acalentava, que era mudar de curso universitário, se solidificou e eu lutei para tal. Tive sorte: não estava estudando, o ápice da crise da minha mãe aconteceu às vésperas do ENEM e eu estava desestabilizada. Mas, me agarrei ao projeto e fui adiante, com os limites impostos. Sonhei até em fazer curso fora de Pernambuco, acredite! Mas, fui para a UFRPE, um mundo novo e fascinante. Um mundo que abriu portas, me trouxe amigos que me abraçaram em minhas debilidades e situações onde despertei habilidades e exigiram esforço - como trabalhar na área de verdade, como professora, seja por estágio remunerado, substituições ou o clássico obrigatório para fechar o curso. Minhas viagens não eram mais tão gratuitas - contribuíram para construir o espírito necessário para, depois, aprender a criar artigos e defesas de projetos. Minhas vivencias moldaram a profissional que sou, tendo que me adaptar e me reinventar cotidianamente.
Enfrentei muita coisa - viver sozinha na casa dos meus pais, me deslocar para diversas cidades, viver correndo de lá pra cá. 

Em 2018, saí de casa para morar com meu companheiro. Inicialmente, uma vida fácil, que ficou difícil quando as limitações foram aparecendo. Ao mesmo tempo, os contatos que fui construindo e o crescer da minha reputação me levaram ao primeiro emprego longo - quatro anos dando aula de Espanhol (logo eu, que morria de medo da língua estrangeira!). Pouca carga horária, malabarismo para os prazos, dinheiro pouco que servia o básico. E mais contatos, que me levaram ao PREVUPE e à busca por este trabalho temporário, ano após ano. Era pouco, mas era essencial.
A vida mudou. As viagens e os amigos de longe ficaram cada vez mais distantes - e aí vem a certeza dos laços reais. De quem era de fora, poucos ficaram. Por vezes, lamento; mas, é a vida. Eu sempre vivi cercada de coisas passageiras, e os poucos que ficaram são alicerces e garantias de bons momentos. Esperar mais é exigir que os outros estejam dispostos a me sustentar emocionalmente, e isso eu fui aprendendo.

Chegou 2022 e uma nova decisão gerou uma nova mudança: a decisão de me aventurar em concursos e seleções. Voltei à viajar, rodando por Pernambuco e usando estas viagens, mais uma vez, como desenvolvimento e construção. Até que meus esforços foram recompensados por quatro vezes: Recenseadora no IBGE (trabalho que não me adentrei muito, mas que me abriu horizontes sobre a realidade social fora do meu mundinho protegido); ADI na Prefeitura do Recife, que me reconectou à Educação, mais ainda à pública; professora na Prefeitura de Igarassu, que me colocou no lugar certo, onde percebi que queria estar: dando aulas de Língua Portuguesa, buscando dentro de mim as formas de construir um conhecimento sobre esta língua tão rica e tão repleta de regras num mundo hoje tão repleto de comunicação rápida e eficaz.  

No final do ano passado, veio a aprovação e chamada do primeiro concurso: Prefeitura de Riacho das Almas.

E, aqui, vem o real momento em que o cata-vento da vida realmente foi percebido girando.

Professor de Língua Portuguesa tem maior carga horária, não dava pra me manter na Região Metropolitana. Tampouco podia virar as costas de casa pra sempre: a minha família foi abalada pela perda da casa onde vivi toda a minha vida e o câncer da minha mãe (só em abril a minha mãe entrou em remissão). Escolhi viver em Caruaru - e digo eu, porque tínhamos a opção de ir direto pra Riacho, e eu preferi aqui. Aliás, eu não escolhi - fui escolhida, pelas emoções que tive ao encontrar um apartamento para alugar com coisas que me lembravam minha casa perdida e as facilidades a ela intrínsecas.
Ainda que a coisa fosse corrida e pouco responsável, aqui cheguei.

Hoje, percebo que as habilidades desenvolvidas no passado me moldaram: viver sozinha em Maranguape 1 me ensinaram a me virar com as dificuldades de, ultimamente, estar sozinha por aqui. Minhas habilidades enquanto professora me fizeram me adaptar a uma nova realidade escolar, mais fácil em partes. Estou diante de uma sociedade diferente, de costumes diferentes. Tive que abrir um pouco a minha guarda: encontrei pessoas que, como eu, estão no mesmo caminho. 

Tudo converge, nada é por acaso.

Outra coisa que também me ajudou foi a mudança espiritual: tenho me esforçado para uma nova compreensão da vida: receber, sentir, ser grata, deixar ao Universo aquilo que não mais me encaixa, que não mais sou. Tenho sentido mais o mundo ao meu redor. Tenho retomado desejos e coisas que estavam em mim perdidos - e esse longo texto é prova disso. 

Há coisas que, percebo, estão distantes e talvez não voltem mais. Há coisas que, todavia, eu ainda posso reconectar. Minha vida não é feita de páginas em branco, aberta para que outros escrevam - hoje, eu as escrevo e, diariamente, posso sentir que sou "eu e mais um dia". Eu mudei e não mudei, enfim.

Ouço as mesmas músicas, abro a mente para outras. Leio as mesmas coisas, de formas diferentes. Tento me entender, tento me alinhar. Tenho mais confiança de que posso, embora meus defeitos não estejam totalmente sanados. Tenho cada dia como um novo começo; estou disposta a viver. A crescer. A aprender. A me amar.

A mudança que eu tanto sonhei, que eu acalentei ao longo de toda a minha vida. E, como escreveu Marcos Rey, nas últimas linhas do "Dinheiro do Céu" - APERTO O PASSO. O FUTURO É UM ÔNIBUS, NÃO POSSO PERDÊ-LO.









 




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