"TOM ZÉ - TODOS OS OLHOS"
(1973)
Não considero nada fácil falar de Tom Zé, até porque falar de um tropicalista de raiz, cuja essência não variou nos anos seguintes ao movimento tropicalista propriamente dito (não posso dizer isso dos demais integrantes, com quiçá exceção de Gilberto Gil) é ter consigo um conhecimento ilimitado de todos os fundamentos musicais.
E isso, me desculpem, eu não possuo.
Por isso, falar de um dos discos dele - polêmico por sua capa, clássico pelo nível de suas canções - vem com uma carga de responsabilidade imensa. Responsabilidade que vou me esforçar aqui para ser capaz.
O disco "Todos os Olhos" foi lançado em 1973, com toda a sua polêmica estética na capa: criada por Reinaldo de Moraes (embora haja uma polêmica interessante entre ele e Chico Andrade, que se considera o artista), foi considerada a segunda melhor capa do século XX pela Folha de São Paulo (perdendo apenas para a capa clássica dos Secos e Molhados), e em 2011 fez parte da exposição das melhores 50 capas de discos de todos os tempos.
A imagem não poderia ser mais inusitada, mais tropicalista: um ânus com uma bola de gude. Vista sem a atenção devida, pode passar até como boca... Mais ou menos, né? Porém, muitos assim pensaram, até mesmo o Tom Zé - que assumiu apenas em sua biografia, anos depois.
O debate é interessante: Chico Andrade publicou, além de uma postagem-homenagem, fotos que, segundo ele, "iniciaram a sessão de fotos"; contando também que se usou de prostitutas que "cobraram um cachê". Já o Reinaldo de Moraes, quem tem em seu favor os créditos do disco, informa que foi graças a uma "ex-namorada paciente". Enfim, né? Quem tirou a foto todo mundo quer o título... Mas @ modelo da foto não teve os créditos...
Quanto ao que tange ás músicas, Tom Zé faz uma deliciosa salada musical. "Complexo de Épico" é uma crítica aberta aos compositores "sérios", "complexados" da nossa MPB (por que, aqui, senti uma bela de uma porrada ao Chico Buarque? A primeira vez que ouvi este disco, tive a sensação; já que é histórico o não-entendimento do compositor com o movimento musical criado no fim da década de 1960) - que corresponde a um prelúdio na primeira faixa e completa na última ; "A noite do meu bem", clássico de Dolores Duran; "Brigitte Bardot", onde o compositor falava do envelhecimento da estrela francesa, onde residiam os sonhos de vários homens - que, agora "vão pedir divórcio"; "Cademar", obra conjunta de Tom Zé e de Augusto de Campos, um dos expoentes da Poesia Concreta e colaborador especial do Tropicalismo... Entre outras e outras canções. Destaco "Todos os Olhos", música-título, pela intensidade da letra.
Eis ela:
"De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá de dentro da escuridão,
esperando e querendo
que eu seja um herói.
Mas eu sou inocente,
eu sou inocente,
eu sou inocente.
De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão
esperando e querendo
que eu saiba.
Mas eu não sei de nada,
eu não sei de ná,
eu não sei de ná.
De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão
esperando que eu seja um deus
querendo apanhar, querendo que eu bata,
querendo que eu seja um Deus.
Mas eu não tenho chicote,
eu não tenho chicote,
eu não tenho chicó.
Mas eu sou até fraco,
eu sou até fraco,
eu sou até fraco."
(Eu sei, eu NUNCA destaco uma letra em especial. Mas essa foi a que me atraiu, de início - velho e bom ano de 2004! - à este vinil)
No mais, sem mais!
post scriptum: Ainda há outro disco de Tom Zé que desejo apresentar aqui. Mas, este é outra história... Para breve, espero!
Para ouvir, o álbum completo!
MÚSICAS DO DISCO:
A Noite do Meu Bem (Dolores Duran)
Cademar (Augusto de Campos - Tom Zé)
Todos os Olhos (Tom Zé)
Dodô e Zezé (Odair Cabeça de Poeta - Tom Zé)
Quando Eu Era Sem Ninguém (Tom Zé)
Brigitte Bardot (Tom Zé)
Augusta, Angélica e Consolação (Tom Zé)
Botaram Tanta Fumaça (Tom Zé)
O Riso e a Faca (Tom Zé)
Um "Oh" e um "Ah" (Tom Zé)
Complexo de Épico (Tom Zé)
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