Ontem cheguei em casa mais cedo.
Silêncio das onze horas. Entrei no meu quarto, liguei o ventilador - o calor tava terrível - e o rádio.
Peguei a minha velha pasta transparente, onde guardo meus papéis mais importantes.
Atrás da certidão de nascimento, dos certificados de eventos e cursos, dos meus documentos e recortes de jornais de vestibular, dos papéis do meu tempo como evangélica e algumas lembranças de amigos e família, existe uma divisória, a última.
Me detenho nela, e retiro os papéis. Minhas lembranças mais preciosas.
A nossa primeira conversa no MSN. A conversa que tivemos no dia seguinte à nossa primeira conversa telefônica. A nossa conversa mais longa, que durou uma tarde e boa parte da noite. A conversa em que eu começara disposta a terminar tudo, e acabei recebendo um inesperado e inocente "eu te amo", que talvez tu não tenhas notado na hora.
E, claro, a tua carta. Palavras que eu sei de cor, desejos implícitos.
Que cumpristes à risca, em nosso encontro.
Não só fizestes isso: também tornaste realidade os desejos que também havia posto no papel. Que voou de Maranguape 1 até Jacarepaguá e que caíram nas tuas mãos. E te fizeram feliz, tal qual as que fizeram um caminho oposto me fizeram.
Nós fomos realidade, mon chérie. Por 7 dias, fomos mais reais do que qualquer outra realidade.
E será para sempre.
Há a ausência, há a solidão. Sim, há. Mas para que vou te dizer isso? Para tentar te prender às minhas tolices, como fizeram comigo? Para um dia, dizeres que está cansado e te autoexcluíres da minha vida? Não. Que as lembranças que tenhas de mim sejam da menina de riso louco e palavras numa folha de caderno em caneta de cor verde. A que morreu de rir quando fazias caretas para uma menina de 7 anos, no carro que nos levava ao nosso primeiro destino juntos. A que acordava antes de você e não se cansava de achar-te lindo enquanto dormia. A que fazia questão de tomar o achocolatado quente e o pão com presunto e/ou queijo contigo, todas as manhãs. A que foi contigo na tua maracutaia de entrar ilegalmente no refeitório na hora do almoço só para poder comer gelatina (e já tinha almoçado fora, viu??). A que pegou seu mp4 emprestado por quase todos os dias para quando precisasse se isolar do mundo. A que perdeu a paciência contigo, mas que preferia dormir fora da barraca dela a te expulsar de lá. A que quase te sufocou com o abraço dado após a montagem da barraca.
A que parou por uns segundos, esperou, e tirou a foto dos dois surfistas na praia do futuro. A que chorou cantarolando na interminável volta da Praia do Futuro (quase 2 horas de viagem, acho). A que, na noite em que os gêneros se inverteram (O ENEH gay), saiu com a mão na cintura tua, pois os meus saltos te fizeram ainda mais alto do que és (como perfeccionista que és, nada deixaste ao acaso... Nem as unhas, a maquiagem, nem os saltos!). A que, como despedida, passou quase uma hora jogando adedonha, jogo da velha e pedra-papel-tesoura contigo.
Essas são as lembranças que quero que tenhas de mim. Não da menina que hoje se alterna entre a alegria de ter vivido e a tristeza de não ter mais. Essa está longe do seu alcance - literalmente.
Por isso, não me interessa as palavras de consolo dos outros, nem os conselhos. Sou teimosa pra cassete, quase nunca escuto as pessoas. E não vou ouvir agora. Apesar da minha inconstância, o amor que sinto é maior. Quero que sejas feliz, pois mereces. Eu sei andar, ainda que não pareça.
E um dia vou te encontrar de novo. E vou querer de ti apenas uma coisa: um abraço. Como o do nosso encontro, como os das nossas despedidas. Nada mais peço, o meu amor só precisa disso.
Seja muito feliz, estrelinha.
Sabes muito bem, eu te amo, muito.
E guardei os papéis, e recolhi a pasta. E beijei a cruz da minha pulseira, e enfim consegui dormir. Não antes de agradecer a Deus por tudo o que tive, por ter te tido.
Morarás até o fim em minha pasta. Em minhas memórias.
És a bagagem maior da mochila da minha vida.
O capítulo mais essencial da minha história.
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